No mês em que se comemora o Dia dos Povos Indígenas, a mais nova aldeia do Rio Grande abriu suas portas para a comunidade local. A Aldeia Tãnhve, da etnia kaingangue, realizou um dia de acolhida na Colônia de Férias do Daer, localizada no balneário Cassino, no último domingo, 16.
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Durante toda a tarde, o evento teve gincanas, apresentações de danças típicas, degustação culinária e venda de artesanato. A FURG esteve presente por meio do seu Coletivo Indígena, da Secretaria de Comunicação (Secom), que registrou o momento, e da Diretoria de Arte e Cultura (DAC), que pôde dialogar com a comunidade e ouvir suas demandas, bem como presenciar o desejo de alguns jovens indígenas em cursar a universidade.
O clima agradável contribuiu para a realização da gincana no pátio, com direito a acirradas disputas esportivas em provas como arco e flecha e a corrida com toras.
Bacharel em Direito pela FURG, Jocemar Cadete contextualizou sobre a vinda do povo a Rio Grande e à nova morada. Ele, que também é pertencente ao povo kaingangue e vem da terra indígena Rio da Várzea, apresentou algumas das atividades da gincana e suas origens.
Ao longo do dia, houve também comercialização de artesanato, que incluiu objetos confeccionados com penas e plumas de aves, sementes de pau-brasil e mandíbulas de piranha, entre outros adereços naturais.
Alguns cartazes pintados à mão decoravam o espaço, com dizeres como "Tire o preconceito do caminho que eu vou passar com meu cocar", frase bastante usada pelo Coletivo Indígena da FURG e que virou até nome de exposição fotográfica.
Com a chegada da chuva ao final da tarde, o público se deslocou até o interior do salão onde foram servidos rahrár (bolo de milho ralado), fuá, carne na brasa, peixe assado, farinha de milho, kajyka (canjica) e outras iguarias. O dia foi encerrado com apresentações de danças e cantos típicos do povo kaingangue.
A nova morada foi ocupada após muitos percalços na trajetória da comunidade. A cacica Angela Nunke Ferreira relatou as dificuldades por que passaram desde a sua saída da Reserva Indígena da Serrinha em Ronda Alta, no Norte do Estado, em outubro de 2021. Após violento conflito com latifundiários que culminou com a expulsão dos kaingangues da reserva, o grupo se deslocou até Rio Grande. Na nova cidade, instalaram-se provisoriamente em residências localizadas próximo ao Hospital Psiquiátrico da Santa Casa até março deste ano, quando encerrou o prazo para a permanência. As dez famílias foram realocadas na Colônia do Departamento Autônomo de Estrada e Rodagem (Daer) há poucas semanas. A área possui 16 casas em estado de abandono.
Mãe de três filhas que cursam o ensino superior, sendo duas delas na FURG, a cacica Angela explicou que a retomada foi realizada "para as pessoas que talvez não conheçam nossa etnia, nossa cultura e toda a questão indígena. Muitos dizem que nós, indígenas, somos perigosos. Não somos perigosos, somos humanos, a mesma coisa que vocês. Não fazemos mal a ninguém, só queremos respeito".
A dupla Gesca Anú e Emilio Caffaro também marcou presença na acolhida com o projeto Germinar Malabares. A criançada se divertiu entre bambolês, malabares e muitas acrobacias no gramado. "Foi uma tarde linda, de muito acolhimento e intercâmbio cultural. Todo e qualquer espaço é possível de se tornar uma zona educativa, e essa é uma ferramenta poderosa na construção de um mundo melhor", avaliou Gesca. "Partindo da ideia de que todo território é território indígena e de que toda a Abya Yala é terra originária que foi invadida, é importante que nós, habitantes da cidade, reconheçamos isso e sejamos cada vez mais aliades na luta indígena e busquemos também nossas raízes e ancestralidade", completou a artista.
Graduação na universidade
Na FURG, o processo seletivo específico para estudantes indígenas teve início em 2011. Anualmente, são oferecidas dez vagas em cursos distintos eleitos por consulta às lideranças indígenas. Desde então, 16 indígenas concluíram a graduação no ensino superior.
Abril Indígena
Integrando as ações relativas ao Abril Indígena na cidade, as comunidades indígenas do Rio Grande, FURG e MPF realizaram na terça, 18, a exibição do filme "Guata" (2022), produzido por dois cineastas indígenas. Houve também exibição de vídeos com depoimentos de lideranças kaingangues de Rio Grande. Após as exibições, houve debate com a presença de lideranças das quatro comunidades indígenas locais, do procurador da república Daniel Luis Dalberto e do professor Marcelo Gobatto (ILA-FURG).
Atividades em Planalto
Neste 19 de abril, o Coletivo Indígena da FURG realiza atividades na cidade de Planalto (RS), que incluem programação em uma escola local. Haverá cine debate, exposição de artesanato e palestra com psicóloga, educador físico, estudante de Direito e a assessor jurídico da Articulação dos Povos Indígenas na Região Sul (Arpinsul). Para fechar a programação em Planalto, acontece a divulgação da 1ª Copinha Tavino Morais, que será realizada no Dia do Estudante, com um convite especial a todas as escolas indígenas do município.
Feira das Artes
Ainda na programação do Abril Indígena, a Feira das Artes acontece no dia 26 de abril, no entorno do Centro de Convivência (CC) do campus Carreiros. A comunidade indígena estará comercializando sua arte junto aos estudantes do curso de Artes Visuais. O evento acontece das 14h às 19h e é aberto à comunidade em geral.
Sala do Coletivo Indígena
Um encontro com as lideranças indígenas acontece em 3 e 4 de maio, em uma organização entre o Coletivo Indígena e a Pró-reitoria de Assuntos Estudantis (Prae). Em seguida, será inaugurada a sala do Coletivo localizada no CC, no espaço anteriormente utilizado pela Caixa Econômica Federal.
Quatro aldeias
A cidade do Rio Grande abriga, atualmente, quatro aldeias indígenas. A primeira delas é a Goj Tanh ("Mar Azul"), da etnia kaingangue, situada atrás do Horto Municipal, no Cassino. A aldeia Pará Rokê ("Portal do Mar"), da etnia mbya guarani, está localizada em Domingos Petroline, na antiga Fepagro. E a aldeia guarani Y'Yrembé ("Beira-mar") situa-se no Camping Municipal do Cassino. A mais recente delas é a Aldeia Tãnhve ("Coqueiro").
Nova nomenclatura
Em 2022, o tradicional "Dia do Índio" passou a ser chamado de "Dia dos Povos Indígenas" após a Lei 5499/19, de autoria da ex-deputada e atual presidente da Funai, Joenia Wapichana. O termo "índio" era considerado problemático por ser genérico e preconceituoso, além de não considerar a diversidade das etnias. O Brasil possui uma diversidade de mais de 305 povos, com cerca de 275 idiomas originários e uma população superior a 1 milhão de indígenas.