ALDEIAS INDÍGENAS DE RIO GRANDE

Aldeia Y'Yrembé instalou-se na cidade por motivos espirituais

Comunidade guarani tem no artesanato a sua principal fonte de renda

Foto: Luiz Henrique Silva

Os povos originários do Brasil são diversos, plurais e reivindicam o reconhecimento de suas identidades. No Abril Indígena, o portal da FURG abre espaço para uma série de reportagens sobre as três aldeias indígenas da cidade do Rio Grande (RS).

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Neste segundo artigo da série, é a vez da aldeia guarani Y'Yrembé, conhecida na região pela beleza de seu artesanato. Em permanente contato com os não-indígenas, a comunidade costuma receber estudantes da FURG e de outras instituições de ensino para ensinar aspectos da sua cultura.

Série Aldeias Indígenas de Rio Grande - Y'Yrembé (Beira-mar)

O povo guarani pertence ao grupo linguístico Tupi-guarani, sendo encontrado no Brasil e também na Argentina, Bolívia, Paraguai e Uruguai. Alguns vivem em pequenas aldeias, em beiras de rodovias e também em acampamentos. A população guarani no Brasil é estimada em torno de 34 mil pessoas, composta pelas parcialidades Kaiowa, Nhandeva e Mbyá.

Os indígenas mbya guarani da Aldeia Y'yrembé moram no município de Rio Grande desde 2016. Em sua maioria, a família veio do Paraguai e da província de Missiones, na Argentina, passando por São Miguel das Missões e depois Barra do Ribeiro. Lá, a filha menor do cacique Eduardo Ortiz ficou doente e, através da casa de reza, receberam orientação para levá-la para perto do mar. "Por isso viemos para Rio Grande, porque seria um bom lugar para ela viver com saúde. Escolhemos para nossa aldeia o nome de Y'yrembé, que significa 'beira-mar'", conta o cacique. "Em um primeiro momento, nos instalamos nas terras da extinta Fepagro, em Domingos Petroline; depois, em 2018, nos instalamos na Fazenda Invernada Campeira, contando com o apoio de um casal de amigos, que arrendava o local. Entretanto, com o falecimento do fazendeiro, em março de 2020, tivemos de sair desse lugar. Mesmo assim, por motivos espirituais, decidimos permanecer no Rio Grande."

Os mbya guarani de Rio Grande estão em permanente contato com os não-indígenas (juruá), mantendo com eles relações tanto nos espaços urbanos, como a venda de artesanato e participação em atividades da universidade, como em visitações nas suas próprias aldeias, onde os indígenas recebem os estudantes da FURG, da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e escolas municipais e estaduais para ensinar aspectos da sua cultura. Durante as visitas nas aldeias, às vezes cozinham e oferecem o chipá (bolo frito), mbojapé (pão tradicional), rorá (farofa de mandioca e milho) e avaxi bity (milho assado).

Os principais artesanatos elaborados na aldeia Y´yrembé são os cestos (ajaka), os bichinhos de madeira (vicho ra'anga), colares, brincos, pulseiras, filtros dos sonhos, mensageiros dos ventos, arco e flecha (guyrapas), paus de chuva e cachimbos de barro (petynguás). Os vicho ra'anga são as esculturas em madeiras em forma de animais, que representam a fauna nativa: onça, tucano, coruja, tamanduá e quati, entre outros.

O artesanato é a principal fonte de renda da aldeia e possibilita as trocas entre os mbya e os juruá (não-indígenas). Nem sempre os objetos no artesanato comercializado têm o mesmo valor simbólico que os objetos tradicionais usados em rituais. Um exemplo é o petyguá, cachimbo ritual, que guarda grande importância para a cultura guarani. Através dele, é possível comunicar-se com Nhe'e (alma-palavra). No petynguá queimam fumo de corda que produz o tataxina, fumaça sagrada. Ela é a manifestação da divindade através do Karaí (líder espiritual). O petyguá é considerado pelos Y'yrembé uma grande proteção divina, como se substituísse a casa de reza na sua ausência, pois é utilizado na cura de doenças espirituais, nos rituais da colheita, nas cerimônias, quando o Karaí vai dar nome a uma criança, etc.

A aldeia Y'Yrembé sempre manteve estreito diálogo com os professores e estudantes universitários da FURG, que vivenciaram na prática noções de interculturalidade, diversidade cultural e pluralidade epistêmica por meio do diálogo mestres e mestras dos saberes tradicionais. Em diferentes cursos da universidade – Letras, Artes Visuais, Psicologia, História, Arqueologia, Engenharia Civil - tal encontro de saberes propiciou modos práticos e vivenciais de trocas e aprendizagens, tanto nas aulas dos mestres na universidade como também nas comunidades visitadas, o que permitiu aos alunos conhecer melhor a territorialidade dos saberes e fazeres dos povos tradicionais.

Texto: Professora Letícia Ponso (docente/ILA/Neabi-FURG) e acadêmica Thaísa Freitas, Projeto de Extensão e Cultura "Revitalização e Difusão da Cultura Guarani e Kaingang em Rio Grande", Instituto de Letras e Artes – DAC – Proexc – FURG. 
 

 

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Comunidade guarani tem no artesanato a sua principal fonte de renda

Foto: Eduardo Ortiz