A FURG, em parceria com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) inaugurou na última segunda-feira, 5, o laboratório-escola flutuante da agrobiodiversidade do Bailique. O projeto coordenado pela Escola de Químicas e Alimentos (EQA) consiste na criação de um Centro de Vocação Tecnológica (CVT), na intenção de promover qualidade de vida para as 42 comunidades tradicionais que compõem o Arquipélago do Bailique, localizado no Amapá. O projeto é referência internacional na área, contando com o apoio de diversas organizações como o Greenpeace, por exemplo.
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Idealizado em 2015 pelo MCTI, o projeto é desenvolvido pela FURG em conjunto com o Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá (IDSM), Associação das Comunidades Tradicionais do Bailique (ACTB) e Oficina Escola de Lutheria da Amazônia (Oela). A universidade - que já desenvolvia um projeto sobre microalgas junto ao Ministério – foi convidada para coordenar a iniciativa, cuja intenção é capacitar para o manejo de produtos e desenvolver tecnologias sociais para o desenvolvimento sustentável.
Com a coordenação do professor Jorge Alberto Vieira Costa, docente do curso de Engenharia Bioquímica e Engenharia de Alimentos da FURG, o projeto também tem como objetivos capacitar estudantes nas problemáticas das políticas públicas, estimular os membros das comunidades tradicionais a atuar pelo desenvolvimento sustentável e promover a inclusão social por meio da capacitação tecnológica de jovens nas áreas das tecnologias sociais sustentáveis. Além disso, o trabalho busca melhorar o processo de extração de óleos vegetais, suprir demandas de água, de atividades de processamento de açaí e disponibilizar a infraestrutura necessária para o desenvolvimento sustentável da região.
Para viabilizar o trabalho, a EQA construiu um CVT para investir na transformação por meio de estruturas educacionais. Foi projetado então o curso técnico em alimentos da agrobiodiversidade, ofertado inicialmente em um centro comunitário na comunidade do Arraiol. “Desde o início era nossa intenção a construção de uma embarcação flutuante para abrigar o curso e os laboratórios necessários para o desenvolvimento das atividades educacionais, mas isso levou um tempo – tanto para disponibilização de recursos quanto para a construção do barco. Após 7 anos de projeto, conseguimos inaugurar a estrutura planejada”, explicou Jorge.
Ao todo, com quatro turmas formandas, o projeto graduou 80 jovens do Bailique, além de duas turmas na cidade do Rio Grande. De acordo com Jorge, a logística da região se dá pelas águas, uma vez que não há estradas ligando as comunidades. Por isso, a embarcação consegue atender com muito mais agilidade os estudantes do arquipélago. “Dependendo da comunidade de origem, alguns estudantes levavam mais de 30 horas em deslocamento até o centro comunitário para a realização do curso. Com o laboratório-escola podemos atender as demandas desses estudantes com muito mais agilidade e acessibilidade”, complementou o professor.
Sobre a embarcação e as especificidades do projeto
Com 200 m² de área, o laboratório-escola dispõe de estrutura para sala de aula, laboratório equipado e cozinha para atividades práticas; além de almoxarifado e dormitório. De acordo com informações do MCTI, o flutuante também está equipado com planta para liofilização do açaí, processo que consiste na transformação da polpa em pó.
O projeto do CVT Bailique é totalmente financiado com recursos do MCTI e está em curso desde 2016. O valor global do projeto é de R$ 6,2 milhões.
Outro fator de pioneirismo do projeto foi a elaboração de um protocolo comunitário para o atendimento de comunidades tradicionais. Baseado no protocolo de Nagóia, da ONU, confere à iniciativa um fator de referência, inclusive despertando o interesse de diversos órgãos internacionais para o desenvolvimento de parcerias, como o próprio Greenpeace, que, em 2019, fez a doação de refrigeradores movidos a energia solar para que os produtores pudessem armazenar seus produtos apropriadamente – e com sustentabilidade -, em razão da instabilidade no fornecimento de energia elétrica para a região.
Para o reitor, Danilo Giroldo, é um orgulho coordenar o projeto que articula diferentes organizações comunitárias e instituições com a finalidade de potencializar a vocação produtiva do Bailique. “Desde o início tem sido um processo horizontal de interação da universidade com a sociedade, apoiado pelo MCTI, e que demonstra a viabilidade de produzir superalimentos de forma sustentável, gerando trabalho e renda para comunidades tradicionais e contribuindo com programas de segurança alimentar e combate à fome”, destacou o professor.
Ao longo dos 7 anos de projeto, o curso ofertado no Bailique formou 80 jovens, além de viabilizar a criação de uma agroindústria, a organização de uma cooperativa, e a promoção de uma estrutura educacional com a formação da escola-família do Bailique.
Infraestrutura
Situado às margens do rio Amazonas, o acesso logístico à região não é tarefa fácil. Estima-se uma viagem de 12 a 14 horas de barco de Macapá, região urbana mais próxima ao arquipélago. Esse complicado acesso é uma das razões pelas quais a energia produzida no local é instável e, corriqueiramente, deixa os habitantes em uma situação de vulnerabilidade, principalmente no que tange ao armazenamento da polpa de açaí e pescado, produtos essenciais para consumo e principal base geradora de renda do local.
Ao longo do desenrolar do projeto, diversas ações foram tomadas para melhorar a infraestrutura local e conceder mais conforto aos produtores locais, inclusive com a instalação de internet e o aprimoramento das redes elétricas por meio de placas fotovoltaicas.
Cadeia produtiva
O projeto CVT do Bailique está estruturado a partir da cadeia produtiva do açaí. No Bailique está o único açaí com certificação FSC (Forest Stewardship Council) de manejo sustentável do mundo, que foi conquistada por meio da ação do projeto. Além disso, a iniciativa também acumula a certificação de produto vegano da SBV e o Selo Amapá de produto do Meio do Mundo.
Com a embarcação flutuante, a ideia é agregar ainda mais valor ao açaí. O processo de desidratação de alta tecnologia mantém as características nutritivas do produto. “Com o liofilizador, os produtos do açaí entram em um novo momento. O açaí liofilizado é vendido em países como Estados Unidos e Europa a U$ 1 mil o quilo. Esse é o ganho que a comunidade pode ter: produtos de melhor qualidade e retorno em renda e recursos para a comunidade e para a escola-família”, avalia o coordenador Jorge.
“Esse projeto é muito caro ao MCTI à medida que consegue conjugar ciência, inclusão social, biodiversidade amazônica, participação da comunidade e vários outros aspectos. Esse é um exemplo de como a floresta pode ser explorada de modo sustentável, gerando renda e qualidade de vida para a comunidade local”, informou o secretário de Pesquisa e Formação Científica do MCTI, Marcelo Morales.