DIVERSIDADE

Processo seletivo para Pessoas Trans é tema de reunião

Vice-reitor reuniu-se com representantes da ALGBT RG para começar o diálogo

Na manhã desta terça-feira, 9, o vice-reitor Renato Duro Dias; a coordenadora de ações afirmativas, inclusão e diversidades, Elisa Celmer e a assessora de projetos estratégicos da FURG, Letícia Chaplin estiveram presentes em uma reunião virtual com a vereadora Maria Regina e a atual presidente da Associação de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgêneros do Rio Grande (ALGBT RG); Fabiula Weickamp. Na ocasião, discutiu-se a intenção da gestão da universidade em elaborar e instituir um processo seletivo específico para pessoas trans.

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De acordo com o vice-reitor, uma das propostas da atual administração da FURG objetiva a ampliação das ações afirmativas desenvolvidas pela universidade, especialmente por meio das políticas de ingresso.  No âmbito das ações afirmativas “o acesso é fundamental, mas a qualificação da permanência dos estudantes, bem como, a ampliação e expansão dessas atividades são importantes desafios que deverão ser pensados conjuntamente com as demais instâncias da universidade”, aponta Dias.

Para o gestor, a criação da Coordenadoria de Ações Afirmativas, Inclusão e Diversidades (Caid) tem, “O propósito de fomentar a equidade, no ambiente universitário, por meio da criação e incremento de políticas e programas que viabilizem o acesso, a inclusão, a permanência de pessoas com deficiência e aquelas alvo de discriminação por motivo de gênero, de orientação sexual, entre outros e seguimentos geracionais e étnico-raciais.”

A proposta da reunião era prospectar as demandas, para que seja possível começar a pensar junto aos diversos setores da universidade a construção de um processo seletivo específico para esta população.

Alguns dados da população Trans

Apesar de algumas recentes conquistas da luta política de travestis, transexuais e transgêneros no Brasil, a população trans ainda vivencia uma realidade marcada pela extrema vulnerabilidade social. Os conflitos iniciam-se, geralmente, na família e resultam na expulsão de casa das pessoas trans. Por consequência, ocorre a interrupção precoce da trajetória escolar e a quase impossibilidade de inserção no mercado de trabalho formal.

De acordo com os levantamentos da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), o Brasil é o país com o mais alto índice de morte de população trans no mundo. Este alto índice de violência é o produto da desigualdade social a que este grupo está exposto, uma vez que o processo escolar é interrompido, cerca de 82% da população trans sofre com evasão, conforme estudo realizado pela Comissão de Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

O papel da Coordenação de Ações Afirmativas, Inclusão e Diversidades

Criada em função do compromisso da atual gestão para com as ações afirmativas, com a promoção e permanência de grupos sociais dentro da instituição, com qualidade e dignidade, a Caid atua desde o ingresso até a formação destes estudantes. “A coordenação busca articular políticas de acesso com políticas de permanência, porque não adianta dar condições para ingresso, mas a taxa de evasão continuar alta em função de um ambiente que não favorece a permanência. Junto com isso, existe ainda a preocupação com prevenção de violências”, aponta Elisa.

Segundo a coordenadora, a comunidade acadêmica exerce, muitas vezes, um papel definitivo para a evasão, aqui em específico da população LGBTQI+. “Portanto, não só as condições físicas são importantes, mas também precisa-se ter um ambiente acolhedor e respeitoso”, adiciona a professora.

“Quando iniciamos esse processo, é preciso conhecer as demandas da população trans com objetivo de saber quais áreas do conhecimento possuem interesse para que as vagas sejam disponibilizadas adequadamente. Por isso precisamos ouvir vocês”, conclui Elisa.

A visão de quem vivencia a universidade

Maria Regina, conhecida popularmente como Regininha, foi por muito tempo presidente da ALGBT RG, e hoje, ocupa uma cadeira na Câmara Municipal do Rio Grande como vereadora. Aluna do curso de Pedagogia da FURG, para ela, a instituição ocupa um papel transformador em sua trajetória. “A universidade ressignificou a minha vida, minha relação com os professores, com pessoas cis; porque, realmente, meu processo na educação, nas séries iniciais, na conclusão do ensino fundamental foi um processo bem ruim. Até fui espancada dentro da escola”, relembra Regininha. “Quando cheguei na universidade cheguei com todos esses medos. No primeiro dia tive uma síndrome do pânico em aula; os professores e os colegas me acolheram muito bem, souberam cuidar de mim”, complementa.

“Hoje me reconheço e me vejo de outra forma. Meus professores sempre me acolheram de forma muito humana; na FURG me senti pela primeira vez abraçada por professores. Em certa etapa, durante minha juventude, criei aversão à classe profissional, mas acabei escolhendo o curso de pedagogia e me reencontrei comigo mesmo”, completa Regininha.

Para a vereadora, atualmente, a população LGBTQI+, em especial as pessoas trans e travestis, entenderam que, para fugir do subemprego, é necessário concluir o ensino fundamental e médio, e por ventura, ingressar em um curso de educação superior. “Hoje participo de um grupo bem grande, com pessoas trans do município; a maioria dessas pessoas possui ensino médio completo. Acredito que a aposta em um processo seletivo específico seja certeira e um divisor de águas na vida dessa comunidade”, pontua a vereadora.

“A nossa população escolhe cursos direcionados para a educação, pois é preciso retornar ao espaço da escola não mais como alunos, mas como professores, para não permitir mais que as mesmas histórias se repitam, que as mesmas violências continuem acontecendo, como aconteceram com a gente”, conclui.

Popularização do nome civil seria outro passo importante

Para Fabiula Weickamp, atual presidente da ALGBT RG, um dos primeiros passos para a ocupação deste espaço pela população LGBTQI+ foi um evento em que, em conjunto com outros coletivos, ocuparam o Centro de Convivência (CC) da universidade. “A gente tem muito a agradecer pela parceria com a universidade”, diz.

Em sua fala, Fabiula frisa a importância em popularizar a retificação do nome civil, uma vez que, desta forma, é possível ter um melhor controle em relação a possíveis fraudes no processo seletivo específico.

Além disso, para a ativista, outro ponto principal na construção deste diálogo reside no controle e prevenção a possíveis violências. “Temos muitas pessoas que gostam e respeitam a diversidade, mas não podemos esquecer que existem outras que não pensam da mesma forma dentro da universidade”, conclui.

Encaminhamentos

Construiu-se uma agenda de trabalho, em que serão realizados encontros para aprofundar e discutir os critérios e mecanismos de ingresso. Para as futuras reuniões estarão presentes representantes da Comissão de Processos Seletivos (Coperse), Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis (Prae), da Pró-Reitoria de Graduação (Prograd), bem como outros profissionais e áreas da universidade, para a efetiva construção do processo seletivo.