Já pensou em dar uma nova utilidade para materiais que não são mais usados? E se esses materiais forem equipamentos hospitalares? É exatamente isso que está acontecendo no Laboratório de Modelagem e Protótipos (Lamp) da Escola de Engenharia (EE) da Universidade Federal do Rio Grande (FURG). Por meio de parceria, o Hospital Universitário Dr. Miguel Riet Corrêa Jr. (HU-FURG), vinculado à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), está destinando equipamentos obsoletos e inservíveis ao Lamp, onde eles ganham novas funções.
A iniciativa se destaca como uma ferramenta didática para a formação de novos engenheiros, incentivando práticas e estimulando o interesse pela área da saúde. Além disso, promove a sustentabilidade e impulsiona a inovação tecnológica. O projeto conta com o apoio da Gerência de Ensino e Pesquisa (GEP) do Hospital.
“Os itens encaminhados ao laboratório são aqueles que perderam sua funcionalidade hospitalar devido à obsolescência, falta de peças de reposição ou desgaste pelo uso prolongado”, explicou a chefe do Setor de Engenharia Clínica, Ana Marília Andrade. “Todos os itens foram avaliados e como não poderiam mais ser utilizados em área hospitalar, foram limpos, desinfectados e não oferecem risco na transformação para outras finalidades”.
O professor da EE e coordenador do Lamp, Lauro Witt, destacou que o foco do laboratório está no desenvolvimento de projetos voltados para atender pessoas com deficiência (PCDs), doenças graves ou com comorbidades. “Entre os projetos, temos, por exemplo, projeto original de adaptação das maçanetas das portas para uso por cadeirantes e pessoas com dificuldades motoras; plataformas que facilitam o uso das bancadas para pessoas de menor estatura; delineamento de circulação que permita o acesso com uso de cadeira de rodas; cinto para auxílio na movimentação de cadeirantes; e projeto de cadeira escolar para crianças com nanismo”, detalhou.
Além do impacto social, o professor Lauro ressaltou os benefícios ambientais e econômicos da parceria. “Muitos materiais que, outrora, seriam descartados para reciclagem ou como resíduo pelo Hospital, ganham um maior valor estando na situação de reuso. Isso gera um ganho econômico para sociedade na medida que conseguimos oferecer infraestrutura para os alunos, sem necessitar o emprego de maiores recursos financeiros”.
Entre os materiais reaproveitados, explicou o professor, estão as macas antigas, que se tornaram bancadas e bancos. Já os biombos ganharam nova utilidade como proteções para solda e esmerilagem. Luminárias do setor de cirurgia agora servem como luminárias para estúdios fotográficos de produtos, enquanto irradiadores de ultravioleta usados para esterilização foram adaptados para funcionar como geradores de ultravioleta, acelerando reações químicas em resinas.
“Esse tipo de pintura não pode ser aplicado em itens de uso hospitalar, pois o tratamento e a tinta precisam ser especializados para suportar a frequência diária de limpeza e os produtos químicos utilizados para a desinfecção. Mas, para outras finalidades, como uso em oficinas industriais, podem ser amplamente utilizados”, pontuou Ana Marília.
Em outra frente do projeto, camas hospitalares com mais de 20 anos de uso e sem peças de reposição, estão ganhando vida nova. “Essas camas, que não atendem mais aos fins hospitalares devido a falhas nos sistemas de movimentação necessários para o atendimento em leito, terão suas peças reaproveitadas para a construção de camas comuns, sem movimentação, destinadas à doação”, acrescentou Ana Marília. E observou que “esse é um trabalho longo, já que o uso das peças muda completamente”.
“Muitas vezes, o maior destaque não está na apresentação de inovações, mas na possibilidade de produção de meios de apoio com menor custo”, enfatizou o professor Lauro. Ele ainda lembrou que os materiais voltados para a área da saúde costumam ter custos elevados, tornando essas iniciativas ainda mais relevantes.
Parceria consolidada
Segundo o professor Lauro, a parceria começou em 2003, com o projeto Núcleo de Pré-Qualificação de Sistemas Funcionais (NPQ), vinculado à EE. O projeto promovia oficinas de engenharia reversa e ensino sobre tecnologias embarcadas, bem como visava estimular a criatividade dos alunos do curso de Engenharia Mecânica por meio do reaproveitamento de bens inservíveis descartados pela Universidade.
Ao longo dos anos, o Núcleo teve sua estrutura ampliada para 200m², em formato de pavilhão industrial, e se transformou no Lamp. A mudança foi possível com o apoio do HU, que contribuiu com máquinas, móveis, dispositivos e insumos que foram reaproveitados como infraestrutura e elementos para novos projetos.