No dia 9 de novembro, o minicurso “Bioinsumos para a Transição Ecológica” foi promovido em Canguçu, na sede da Escola Família Agrícola da Região Sul (Efasul), reunindo mais de 50 participantes, entre estudantes e educadores da Efasul e da FURG São Lourenço do Sul (FURG-SLS), e agricultores lourencianos e da Rede Ecovida.
A formação foi proposta e executada pelo Coletivo de Ensino, Pesquisa e Extensão em Entomologia aplicada à Agroecologia da FURG-SLS, junto ao Centro de Apoio e Promoção da Agroecologia (FLD-Capa) e à Efasul, em parceria com a Rede Ecovida. Entre as atividades realizadas, estavam o preparo e a aplicação de Bokashi (adubo orgânico natural), a elaboração e utilização de farinha de osso, e palestras sobre Controle Biológico Conservativo e Fitoprotetores Botânicos.
Patrícia Lovatto, docente da FURG-SLS e integrante do coletivo de Entomologia da universidade, explica que o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) considera bioinsumo todo o produto, o processo ou a tecnologia de origem vegetal, animal ou microbiana, destinado ao uso na produção, no armazenamento e no beneficiamento de produtos agropecuários.
“Mais do que um produto, na visão agroecológica os bioinsumos constituem o resultado de um processo e isso precisa ser construído coletivamente, no diálogo entre pesquisadores, agricultores e extensionistas. Na perspectiva agroecológica, em que trabalhamos, o desafio é desenvolver e estimular a utilização de bioinsumos que garantam autonomia junto às famílias agricultoras”, aponta.
Olhar atento aos bioinsumos
O engenheiro agrônomo Mateus Schwanz Kuhn, do FLD-Capa, aponta que bioinsumos e insumos alternativos são práticas usadas principalmente na transição agroecológica, auxiliam na recuperação do solo e recomposição da fauna edáfica, no manejo de doenças e insetos e no equilíbrio das plantas, trazendo cultivo saudáveis e produtivos.
“No território, possuímos poucas alternativas de insumos para a produção orgânica e agroecológica e muitas vezes as agricultoras e agricultores precisam comprar insumos de empresas de outras localidades, aumentando os custos e mantendo a dependência desse fornecimento. Por isso essas iniciativas são importantes, auxiliando na autonomia, redução de custos e facilidade de uso na unidade de produção”, afirma Mateus.
A professora da Efasul, Letícia Hellwig, também engenheira agrônoma, diz que a substituição de insumos convencionais por bioinsumos ainda é um dos grandes gargalos na transição agroecológica. “Essa substituição é apenas um dos passos, mas extremamente fundamental, para uma transição economicamente viável, socialmente justa, ambientalmente correta e culturalmente aceita pelas agricultoras e agricultores do território”.
Ciência na prática
A interação realizada entre estudantes e famílias agricultoras durante o curso promoveu diálogo frutífero de saberes acerca de algumas possibilidades na agricultura, segundo a professora Patrícia. “Ao mesmo tempo que nós estávamos vendo no curso possibilidades de uso de bioinsumos e pesquisas que existem acerca destes produtos fundamentais para transição agroecológica, nós tínhamos também ali agricultores que estavam colocando os seus relatos com relação à utilização desses insumos”.
Ela lembra que muitos dos bioinsumos que são empregados atualmente ainda não possuem pesquisas, mas vêm sendo utilizados de forma legítima pelas famílias agricultoras com amplos relatos de efetividade, e a integração com os estudantes fomenta a troca de informações. “Para os estudantes que participam dessas atividades, é importante a utilização desses relatos como formas de fazer pesquisa, e também faz com que eles percebam a importância da sua formação profissional, para que a gente possa cada vez mais fazer uma pesquisa que dialogue com as necessidades das famílias”.
“Não podemos pensar os sistemas agroecológicos simplesmente a partir da troca de dependência de pacotes químicos sintéticos por pacotes biológicos, por isso o resgate de produtos e práticas utilizadas pelos agricultores historicamente deve vir acompanhado da pesquisa, da extensão e da organização desta produção e aperfeiçoamento para que as famílias agricultoras não fiquem mais uma vez reféns do mercado”, diz Patrícia.
A docente avalia que a partir de pesquisas, poderão ser identificados dados como a melhor forma de uso e o tempo de validade, ampliando sua aplicação. “É uma área extremamente ampla, aberta e cheia de possibilidades como mercado trabalho para esses estudantes, tanto do curso de Agroecologia, como de Educação do Campo, que estão em vias de formação”.
Presente no minicurso, a agricultora Cenira Correa, moradora do Quilombo Coxilha Negra, de São Lourenço do Sul, diz que gostou muito de ter participado. “Adorei o convite, aproveitei bastante pois aprendi muito com todos. Tinha muita coisa que eu não sabia, e outras eu sabia mas não usava mais na minha vida. O que eu não sabia realmente era o processo da mistura que nós aprendemos com o uso das pás”.
União de esforços
A união de esforços entre a FURG, a Efasul, o FLD/Capa, e a Rede Ecovida para o minicurso foi proveitosa, segundo os realizadores.
Para Letícia, professora da Efasul, a ação trouxe satisfação por ser um momento especial e importante para a agricultura de base ecológica no território. “Ainda mais com a interação de um público tão diverso, estudantes de ensino médio e superior, técnicos, professores e agricultores. Foi um dia intenso de troca de saberes, na luta pela autonomia das agricultoras e agricultores”, avalia.
Já Mateus, representante do FLD-Capa, sinaliza que o grupo espera avançar a discussão da região, com a realização de mais cursos e de outras futuras iniciativas que estão sendo construídas em relação às inovações e produção de bioinsumos.
Patrícia, professora da FURG, diz que as parcerias são fundamentais para a geração de conhecimentos e tecnologias que estejam de acordo com as demandas das organizações que trabalham hoje com extensão rural e também com as demandas de organizações ligadas à agricultura familiar.
“São instituições que atuam a partir de diferentes frentes para a transição e para o desenvolvimento da Agroecologia no território. Então, a partir do momento que nós temos instituições de ensino, instituições de pesquisa e de extensão, bem como as escolas de ensino médio, técnico e organizações da agricultura familiar, nós conseguimos analisar as questões, no caso os bioinsumos, a partir de diferentes perspectivas. E, assim, nós colocamos em prática aquilo que nós chamamos de diálogo dos saberes, para olhar para os problemas, para os desafios e também para as possibilidades de forma conjunta. Sem dúvida também é uma forma de ampliar e fortalecer essas parcerias e dar visibilidade à universidade diante do seu papel enquanto instituição comunitária”, entende.