A partir de uma iniciativa da Fundação Grupo Boticário para o desenvolvimento de soluções para a conservação de ambientes costeiros do Brasil, o Camp Oceano busca, por meio de ações competitivas, estimular a criação de tecnologias que possam atender a demanda pensada pelo projeto. Nesse intuito, uma equipe composta por professores e estudantes da FURG elaborou uma proposta baseada em robótica, com o objetivo de mapear e limpar, de forma autônoma, o ambiente costeiro da região.
De acordo com Jorge Arigony, docente do Instituto de Oceanografia da FURG e parte da equipe, um dos pontos interessantes da competição está em sua organização, arranjada para que os competidores interajam entre si e, também, com mentores. “Nossa equipe já vinha trabalhando em uma embarcação autônoma para o monitoramento oceanográfico e da poluição, no contexto do Programa de Recursos Humanos da Agência Nacional do Petróleo que executamos na FURG - o PRH-22”, destaca o professor.
Além de Jorge, a equipe é formada pelos professores Marcelo Pias e Vinícius Menezes – ambos do Centro de Ciências Computacionais da FURG (C3); e pelos estudantes Ylanna Bandeira, João Felipe Santelli e Lucas Jensen Braga, respectivamente dos cursos de Engenharia de Automação, Oceanologia e Engenharia da Computação.
A competição
Dividida em três fases, a competição tem o intuito de buscar e capacitar o desenvolvimento de soluções práticas para a proteção ambiental costeira, bem como a conservação dos ambientes de relevância ecológica e econômica da costa nacional. A iniciativa deixa claro o foco em encontrar projetos que estejam alinhados aos objetivos da Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU), consistindo, em suma, em ações para a diminuição do impacto das atividades humanas sobre o oceano.
A primeira fase do campeonato envolveu diretamente o aspecto teórico da ideia de cada projeto envolvido. Nesta etapa, as equipes participantes preencheram um formulário de inscrição e enviaram uma breve apresentação audiovisual de suas propostas. De todos os materiais e inscrições recebidos, apenas 40 soluções foram selecionadas para a segunda fase.
Selecionada entre as propostas aprovadas, a equipe da universidade seguiu para a segunda fase da competição, onde durante três dias de capacitação online com palestras e workshops, pôde desenvolver, aprimorar e aumentar o impacto do projeto. Desta etapa, 25 propostas foram selecionadas para a fase seguinte; momento no qual a solução deverá ser apresentada em detalhes por meio de um formulário e um pitch para concorrer ao apoio financeiro para implementação da ideia.
De acordo com o resultado final da segunda etapa da competição, divulgado na tarde desta quarta-feira, 28, a proposta elaborada e apresentada pelo time da FURG durante a segunda fase não foi selecionada para a etapa final. De acordo com Arigony, o Camp Oceano foi uma oportunidade não só de pleitear recursos adicionais para o projeto, mas também, participar de uma atividade que permitiria qualificar a equipe e, ainda, receber um feedback importante para aprimorar e polir a proposta.
Acquablue Smartboat e a sequência do projeto
De acordo com Pias, a ideia do projeto é resultado de um conceito que o professor, anteriormente, havia desenvolvido. “Eu tinha essa ideia e tentei ‘vender’ para um projeto europeu, mas eles acharam muito arriscado”, comentou. Por meio do PRH-22, em uma ação para conectar as unidades de ciências computacionais e oceanografia da FURG, os três docentes começaram a aprimorar a ideia e moldar uma nova projeção para a embarcação.
Chamado de Acquablue Smartboat, a tecnologia contribui para a limpeza do estuário da Lagoa dos Patos, agindo diretamente na retirada de material sólido em suspensão das águas do estuário. “O tratamento desse material recolhido se dá em uma cadeia de processamento de lixo reciclável que pretendemos desenvolver com o envolvimento de comunidades de pescadores artesanais e gestores públicos”, complementou o professor.
De acordo com a equipe, existem estimativas na literatura científica, de que 80% do lixo que vai para os oceanos é composto por plásticos, o que configura um grande problema para os ambientes marinhos. “Pretendemos focar exatamente na retirada desse tipo de material antes que chegue ao oceano com o fluxo das águas”, destacou Arigony.
Durante a competição, o time apresentou o projeto em um pitch de quatro minutos, para concorrer a uma vaga inicial. Após a seleção, e durante a segunda fase, uma série de atividades orientadas estimularam ao grupo discutir a proposta com outras equipes e um mentor designado em concordância com o tema da solução.
Por meio da interação, identificou-se a necessidade de desenvolver um componente socioambiental para o projeto, materializado por meio da incorporação de uma comunidade de pescadores como alicerce do funcionamento geral do smartboat. “Além disso, também mudamos o foco de ação, que inicialmente era baseado em mapear áreas poluídas e lixo no estuário, para uma solução que também faz a remoção desse material”, apontou o professor.
Agora fora da competição, a equipe continua o planejamento para dar sequência a elaboração do protótipo, seguindo na busca por recursos adicionais para implementar a ideia. “O intuito é de que o protótipo a ser desenvolvido amadureça com o uso em ambiente operacional, podendo ser distribuído para outros ambientes estuarinos do país”, disse Arigony.
Para Pias, a competição exerceu um papel importante na organização e amadurecimento da equipe. “Durante este período pudemos focar nessas ideias, deixando mais clara nossa visão para o Acquablue. Passamos a vislumbrar a possibilidade de desenvolver várias embarcações e até criar uma fundação para atingir objetivos sociais e gerenciar as atividades operacionais de uma possível frota automatizada”, comentou.
Iniciativa open source
Open Source é um termo em inglês que significa ‘código aberto’. Essa relação é estabelecida no código fonte de um software, o que o torna adaptável para diferentes finalidades, com distribuição gratuita. Justamente por não possuir custos de licenciamento, esta tecnologia oferece uma alta gama de possibilidades e investimentos derivados. No caso do projeto Acquablue, a proposta se encontra online com total disponibilização e instruções para montagem.
Próximos passos da equipe
Segundo Pias, o próximo passo para manter o projeto ativo e encaminhar um vindouro protótipo, consiste em conseguir um financiamento para possibilitar a elaboração, de maneira mais rápida e ágil, do produto. Esse aporte pode vir de diferentes fontes, como por meio de disputas – a exemplo da configuração do Camp Oceano -, por meio de agências de apoio como a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep); ou, ainda, através de um grupo de empresários dispostos a investir.
Outro passo importante consiste na organização da equipe, que, desde a conversa inicial, multiplicou seu tamanho, e ainda espera receber novos voluntários em breve. “Nosso diferencial está na parte de limpeza, uma vez que a maioria dos outros projetos similares aborda a parte de sensores para a coleta de informações, o que o Acquablue também faz”, explicou Pias.
“Existe a possibilidade de, por meio de um financiamento futuro, desenvolver um piloto para a coleta de plásticos focando na área do entorno da Ilha dos Marinheiros, que é uma região altamente poluída com esse tipo de material”, ressaltou Pias. O projeto oferece, posteriormente, a capacidade de conectar o lixo recolhido com os responsáveis pela coleta e reciclagem, atuando em outro espaço do ciclo de conversação e preservação ambiental.