Com o objetivo de evitar o declínio populacional de um dos peixes característicos dos estuários da região, pesquisadores da FURG unem forças para a criação em cativeiro da miragaia e sua posterior reinserção no habitat de origem. A garantia da diversidade é considerada importante tanto para o funcionamento dos ecossistemas quanto para assegurar a continuidade da pesca.
A presença da miragaia nos mares do Sul do Estado diminuiu significativamente nos últimos anos. Na década de 1980, o índice de pesca atingia em torno de 2 mil toneladas/ano, conforme explica o oceanógrafo Luís André Sampaio. "Pescadores esportivos voltaram a capturar alguma coisa mais recentemente próximo aos Molhes da Barra, Clube de Regatas e até na praia. Entretanto, na pesca artesanal a captura segue praticamente inexistente", completa o responsável pelo Laboratório de Piscicultura Estuarina e Marinha da FURG (Lapem).
A constatação despertou para a necessidade de voltar-se ao repovoamento dessa espécie na região. Era o início do Projeto Miragaia, que hoje se divide em uma série de etapas de produção em cativeiro. Primeiramente, os animais reprodutores são capturados na natureza e levados ao Lapem. A reprodução é feita no laboratório e, uma vez que os ovos são fertilizados, seguem a incubação e a larvicultura. Depois começa a etapa de produção dos alevinos e, finalmente, a fase de engorda. As larvas de miragaia são criadas até o estágio juvenil, fase mais adequada para o repovoamento do ambiente natural. Ao todo, um grupo de 20 pesquisadores promove o monitoramento da diversidade genética dos animais e sua posterior soltura no mar.
Na última reinserção dos peixes, em dezembro, foram levadas ao mar mais de 12 mil espécimes. "No total dessa temporada, produzimos 15 mil peixes para liberação na natureza. Foi a maior atividade de repovoamento até então", conta o oceanógrafo. Os animais foram criados durante todo o ano no laboratório por uma equipe que envolveu estudantes do Programa de Pós-graduação em Aquicultura, além de bolsistas de iniciação científica dos cursos de Oceanologia e Biologia.
O projeto conta com o apoio da FURG, Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (Fapergs). A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) também subsidia bolsa para pós-graduação. Empresas pesqueiras locais também auxiliam nas atividades.
O Lapem possui uma relação informal com as comunidades ribeirinhas de Rio Grande e região, a fim de despertar a conscientização pela causa. "Sempre que fomos falar com os pescadores fomos bem recebidos e todos apoiam o repovoamento. Infelizmente, devido à pandemia do Covid-19, não foi possível aumentar o contato", diz o professor Sampaio.
Previsão de nova soltura
A miragaia (Pogonias courbina) é também conhecida, quando jovem, por borriquete. Ocorre na costa do Brasil, Uruguai e Argentina e pode viver por até 55 anos. Seu hábito alimentar é omnívoro, consumindo bastante crustáceos e moluscos. O peixe chega a atingir 1,7m, com peso máximo registrado de 51,3kg.
O Lapem trabalha também com a criação de linguado, e já realizou a desova de outras espécies como corvina, papa-terra, peixe-rei e bijupirá, além de algumas espécies ornamentais. Atualmente, o laboratório está na fase inicial de um novo período de reprodução da miragaia, com previsão de liberação para o final do ano.