Foi realizado na última segunda-feira, 31, na Asa Norte do Cidec-sul, o evento “Cenas da Ditadura na FURG: roda de conversa e testemunho”. A ação contou com a participação da filha do professor Luiz Laurino, Márcia Laurino – perseguido durante o regime – e do historiador Cleverton Luis Freitas de Oliveira. A atividade, realizada de forma gratuita e aberta à comunidade, foi organizada pelos Institutos de Letras e Artes (ILA), de Ciências Humanas e da Informação (Ichi) e de Educação (IE), em conjunto com a Pró-reitoria de Extensão e Cultura (Proexc).
Em seu depoimento, Márcia recobrou elementos da história de seu pai, o professor Luiz Laurino, que foi perseguido pela ditadura, culminando na sua demissão do quadro docente da FURG. “Na época, a Universidade era uma fundação de direito privada, e que fazia a contratação dos seus professores em modelo celetista, porém, havia um regimento interno que regulamentava todo esse processo. A decisão de romper o contrato sem justa causa com o professor Laurino ia contra todo o regimento interno; o mesmo processo foi feito com outros tantos docentes perseguidos administrativamente pela ditadura e seus agentes”, explica Cleverton.
Segundo Marcia, seu pai sofreu com reduções na sua carga horária de trabalho, além de uma série de ameaças de demissão. “Apesar de não haver estabilidade do servidor público naquela época, qualquer demissão na FURG precisaria ser precedida de uma sindicância, de um processo administrativo disciplinar, com ampla defesa, e contraditório. Não foi isso o que aconteceu”, completa.
Laurino ingressou na FURG em 1975; quase dois anos depois ele é demitido sumariamente, junto a outros professores e técnicos.
“A ditadura violentou, torturou e matou muitas pessoas. E, além dessas marcas, o assédio psicológico deixado nas vítimas sobreviventes persiste durante muitos anos. Este foi um drama muito grande na vida do meu pai, infelizmente”, conclui Márcia.
Luiz Laurino dá nome à Comissão da Verdade do Sindicato dos Professores da FURG (Aprofurg); na segunda metade dos anos 80 teve a sua perseguição reconhecida pela Comissão da Anistia Nacional, sendo assim reintegrado à Universidade.
Em sua fala, Cleverton rememorou a história do estudante de Oceanografia, Adelino Marques Mendes, que atuava como professor do Instituto Juvenal Miller, em Rio Grande, e, na posição de educador, sofreu retaliações do regime por tecer críticas ao governo ditatorial.
“Além de evidências de violação de correspondências, fotografias da sua companheira nos informes militares e outros elementos que dão o panorama de espionagem e perseguição política administrativa, Adelino era alguém em constante medo. Em um cenário cujas garantias de liberdade individual vão sendo derrubadas uma a uma, é normal que a gente imagine o pior; em cartas interceptadas, ele relatava o medo de ser morto. Esse estado de temor era uma estratégia de implementação do terrorismo de estado”, comenta o historiador.
Aprofurg e o relatório da Comissão da Verdade
Cleverton também é o responsável pelo texto que compõe o relatório da Comissão da Verdade da Aprofurg, e que, segundo ele, deve ser publicado em breve. O material trabalha com documentos dos órgãos de informação e espionagem da ditadura a respeito de membros da comunidade acadêmica da FURG. Essas produções visavam tanto subsidiar a repressão violenta do estado quanto as perseguições administrativas.
“Acredito que é importante a gente conversar sobre o tema, pesquisar cada vez mais e compartilhar conhecimento sobre as perseguições e violações dos direitos humanos na nossa Universidade e em Rio Grande. A gente lembra do navio prisão Canopus, local em que aconteceram inúmeras torturas. Então, é importante conversar cada vez mais, pesquisar, construir e partilhar conhecimento sobre esses casos para que a gente lembre que a ditadura aconteceu em todos os lugares do Brasil e derrube, de uma vez por todas, esses mitos que colocam a ditadura como um fator de benesses ao país”, conclui Cleverton.